terça-feira, 25 de janeiro de 2011

De um apaixonado. (Heterônimo 1)

Desculpe se eu não consigo parar de te escrever, de te beijar e de te encarar com demorados olhares fixos, são intuitos cada vez mais rígidos de me aproximar, de me marcar à sua cerca. Tudo faz parte de um jogo meu, no qual tento me penetrar em seus sentidos, fazer você sentir o peso da minha presença e das minhas carícias, para que, quem sabe, assim você acredite em mim, acredite em nós; em quando te digo o quanto te acho divina e quando teorizo sobre sermos predestinados, sermos um encaixe perfeito sem maiores complicações. Desculpe-me pela insistência, apenas não consigo deixar de ser um conquistado por seus encantos. Sucede que nessas noites eu percebo o quanto você me conforta, como amo o seu cheiro, suave como sua seda; seu sorriso iluminando nossa cama; como me arrepio quando roço minhas pernas nas suas, macias e perfumadas à creme de frutas doces exóticas; como sua jogada de cabelo em câmera lenta me impressiona. Seus lábios parecem pedir pelos meus, de uma forma subliminar e oculta demasiadamente sedutora, de um jeito meigo e encantador que só você com seu delicado e provocante charme consegue fazer; mas sei que isso é um reflexo torto meu, que, na verdade, são os meus lábios que gritam pelos seus, por você inteira, com uma fome de leão e nenhuma sutileza parecida com a sua - escancarados mesmo. E seus olhos me embriagam de fantasias. Eles possuem poder, vida própria, são armas que me desarmam, quando se abrem me abrigam, possuem uma luz mágica e física, literal; são completamente pigmentados por significados e conseguem tirar de mim qualquer bravura - fico tão sereno e motivado a permanecer sendo observado por eles, que acabo esquecendo-me de tudo, apenas retribuindo os olhares, cada vez mais fixos, vivos, mensageiros, e enviando como extra todo meu amor e minhas reações involuntárias e incontroladas, fisgadas e partidas por um só motor: você.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Peço por intensidade.

Fico completamente inconformada com a escolha de certas pessoas, pelo morno, pelo escondido, pelo previsível. Talvez seja medo, bem provavelmente. Talvez própria insuficiência. Mas não consigo imaginar como pode ser tão comum e espalhada, essa preferência. Não me atrai nem um pouco nenhuma das escolhas mais aceitáveis, e fáceis. Prefiro quebrar a cara depois, me ferir por não saber lidar com o desconhecido, com o inaconselhável, me perder no envolvimento do mistério, do que me envolver com algo que me venha com um manual de instruções. Vou aprendendo com cada devaneio, com cada louca e insensata escolha, com cada falha minha; e ainda vou, com sorriso torto, deliciando-me com essas sensações agradáveis e intensas, que só o estranho e extenso consegue proporcionar.

Esfriando.

O seu silêncio é o mais perigoso. É o veneno mais disfarçadamente inocente e ligeiro. Não pegar ou largar é a indecisão mais boba e ilusória. Quando apenas uma atitude pode construir um conceito, influenciar uma fuga ou entrega, mas não há evidências suficientes, corremos o risco de nos preciptarmos, falharmos ou cedermos. Então sua ausência vai afastando mais, tanto nossos corpos quanto minha vontade dos meus impulsos. Desfavorecendo assim nosso encontro, ainda mais. E eu aqui, sem saber de você; com quem anda, quanto tempo ainda esperará para me procurar. Só sabendo de mim, e minhas cabulosas ideias e frias sensações. Que é o mais triste, porque de você só me vinha o ardente.

Ocupado com a modernidade.

Abriu a janela e não viu nada. E não porque não havia um belo quadro para poder apreciar de diferentes maneiras, enquanto quisesse, por quando pudesse; porque tinha. Com direito a tons de cores manchadas, os verdes das vegetações e os escuros das construções, entre outros tons destacantes. O que acontecia era que não conseguia enxergar. Por demasiada frieza lhe ter fechado as portas da observação, por a amargura que criara dentro de si lhe impedir de admirar. Nunca mais sentiu o gosto do doce, o gosto do gozo. Não se lembrava dos perfumes, dos bons pequenos prazeres; estava ocupado demais entretido com tantos números e barulhos, pessoas e passatempos artificiais. Nem percebera que não tinha mais quem preparava seu café, que fora mecanizado para cumprir com toda sua rotina imposta e cobrada em um dado horário. Nem ao menos se olhou no espelho para enxergar a transformação. Espelho que nada! Estava ocupado demais com passos acelerados para conseguir vantagens cobiçadas e ralos planos caros.

Expressando.

Que sede de sucesso, de aventuras, de loucuras.
Que vontade incansável impregnou em mim,
de ir atrás do que eu desconheço o fim.

Que fome de ardentes, densas e arriscadas escolhas!
Acordei querendo ir à luta, salvar sonhos e vidas
Soletrar contos e extrair dos fracos a força,
e os conformados, atiçar até se moverem.

Que vontade de mudar tudo,
Começando por minhas coisas
Meu quarto, minha cabeça, minha rotina.
O amor antigo, as músicas, a cortina.

Gritar, enfatizar o mínimo, correr.
Correr sob a chuva fria, sob o céu amarelado.
Desprender todos os arrependimentos do meu coração,
Só deixar de companhia o pulmão.

Não parar de escrever, por longa data, de imaginar, de querer.
Mostrar aos loucos que eles estão certos
E aos padrões, o quão são podres.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Força é algo que você escolhe.

Então você cansa de ser fraca. O papel de vítima não te agrada mais e aquela história de esperar, de pensar, de tomar cuidado, perde a força. Você agora quer ser a força. Você passa para um outro nível de entendimento, de amadurecimento. Você vê que está passando por um momento confuso, de fraqueza, mas consegue enxergar além disso, consegue ver que por mais dolorosa que seja a sua situação, é limitada; e um tanto quanto fútil. Você sempre soube que é forte, que já superou perdas e crises maiores, mais densas e mais difíceis; sempre soube que já conseguiu encontrar o caminho em labirintos mais confusos. Porém, faltava alguma luz, alguma energia que te desse impulso para conseguir progredir. Acontece, acontece; nesses momentos, nos falta luz. Nos falta enxergar com transparência o que, no fundo, já sabemos. Mas então você enxerga. Talvez repentinamente, talvez com ajuda de algum amigo ou de alguma música, mas chega uma hora que você enxerga. E a sua escolha se torna mais poderosa. Então, você escolhe entre abandonar essa crença que vem de manso para te ajudar e adotá-la. Acontece, acontece; muitas vezes estamos envolvidos demais e simplesmente escolhemos abandonar essa ideia de poder superar. Preferimos o drama, preferimos continuar nos arriscando, nos torturando, algumas vezes até sabendo que estamos errando; já passei por isso. Mas agora não. Me sinto forte. Tenho consciência de que já passei por piores, que este será só mais um desafio que trará mais orgulho para mim mesma e mais êxtase para o próximo que ainda vou ter de enfrentar. Então escolho adotar essa visão e crença que me diz que sim, sou capaz. E não é uma crença forçada, eu não apenas acredito, como sei que sou capaz. Cansamos de ser fracos, vítimas, e decidimos nos superarmos. É uma escolha, e poderosa.

Espera, decepção e escrita.

Vontade de escrever. Escrever, escrever, escrever... até a semana acabar, até você decidir ceder, até eu esquecer seu gosto. Escrever com intuito de me perder entre linhas e palavras, escrever para tentar me reorganizar ou explodir de uma vez. Pois é difícil guardar tudo em forma de sentimentos e ideias. É difícil essa cobrança de mim mesma para deixar tudo sereno, tudo visível. É difícil tanto embaralhamento e mais sofridamente não por um erro seu, ou uma palavra errada, mas sim por a ausência disso tudo, a ausência de você e de qualquer palavra. Quando tudo que você deseja é uma palavra, quando você fica na espera por uma manifestação qualquer, mínima que seja, de carinho ou preocupação, quando você fica na expectativa por saber como foi o dia dele, com que expressão facial ele está, o que foi capaz de lhe proporcionar alegria ou inibir seus prazeres; quando você direta ou indiretamente fica na base de aguarda mas ninguém nunca chega, quando o caminho é vazio e nenhuma novidade lhe chega para te confortar, nenhuma palavra para te entusiasmar, e esse silêncio mata cada vez mais suas esperanças e sua vontade de continuar esperando, é o fim? É dado o momento de você abandonar a praça da espera e partir para qualquer outro caminho, nem que seja o de volta para casa? Quando você não tem como obter uma resposta para essa pergunta pois a única pessoa que poderia te dar uma certeza exata do que fazer está imóvel, calada e distante, o que lhe resta? Vá, se mova, ande para lá, para cá, saia do lugar, com ou sem direção, abandonando lembranças e sonhos, abandonando o silêncio. Você agora precisa de uma voz, um barulho, uma ação. Pessoas de atitudes. A noite está vazia demais e quanto menos você tem dele, seja de presença ou de notícias, você sabe, menina, a noite fica mais vazia ainda. Então escreva sobre essa sua dor e raiva pela insegurança e aparente covardia de quem você ainda espera. Escreva, pois é ruim guardar tudo isso em formas abstratas dentro de ti. Escrever para não se perder, transformar textos para não transformar-se em uma pessoa mais gélida.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Construção Paroxítona.

Carlos não era previsível.
Era judicioso, meia estação e egoísta.
Seus tons eram melódicos, seus amores todos Adônis.
Era drástico de causar enjôo.
Costumava, cada plano seu, ser infalível.
Com suas táticas misteriosas, construía-se uma fênix.
De tão gélido, se tornava ignóbil.
E de tamanha coragem, se tornava honorável.
Não era ganancioso, apenas fútil.
De confiança era imarcescível.
Mas quando lhe tocavam a fundo, era imóvel.
Se escondia de olhares melíferos e gestos dóceis.
Refugiava-se e escondia-se em sua cobertura de ignorância.

Parceira X Companheira.

Existe dois tipos de mulher. A parceira e a companheira. A que bebe com você no bar, passa despercebida no quesito interessante e inteligível e é reparada pelos seus amigos devido ao decote. Essa é a parceira. Que te despe no primeiro encontro e sente necessidade de marcar território independentemente do quão inconveniente e persistente esteja sendo nessa cobrança e nesse tanto de sentimento ou representações de sentimentos que joga para cima de você para assim despistar outras concorrentes. E tem a que te diverte e te surpreende, aquela que você admira e que seus amigos a reconhecem pela simpatia e sensibilidade e te elogiam e rotulam como "de sorte". Essa é a companheira. Que também te desperta desejo, como a parceira, mas também insônia. Que ensina receitas para a sua mãe nas tardes de domingo em família. Que é escolhida. A parceira preenche carência, a companheira solidão. A parceira pode te trazer bem estar, mas a companheira traz felicidade. A parceira te rouba beijos, a companheira sorrisos. A parceira você esquece, a companheira te cativa. E é bom lembrar das épocas. A parceira é moderna, mais recente, momentânea. A companheira é futura, mas permanente; antiga nos valores. Cabe ao que procura o homem, o que lhe satisfaz no momento. Distração ou conexão, parceirismo ou companheirismo.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Escolha ser forte.

Tantas ideias fortes sendo agarradas pelo meu espírito necessitado de ordem na minha cabeça. Tantas vontades minhas já foram reprimidas, tantas lições eu aprendi por amar quem não devia. Sim, quem não devia. Sem essa história de que tudo é possível, quando se quer se tem. Chega um ponto em que você gosta tanto de uma pessoa, que fica difícil, praticamente impossível, imaginar um dia você sentindo algo por outra. É horrível. É mais do que doloroso, é amedontroso. Mas quando, repentinamente, você se vê sentindo por outra pessoa, qualquer coisa que seja, do amor mais ardente à dedicação mais profunda, da admiração mais sublime à paixão mais quente, você sente como se renascesse. Você sente, literalmente, como se voltasse a respirar, como se estivesse voltando a aprender como decifrar códigos, distinguir cores. É ótimo, até o momento em que você sente que está se aprisionando àquilo. Você pode abrir os olhos tarde demais e, quando começar a tomar uma decisão de abandono, já estar envolvida demasiadamente e tragada inteiramente pelo outro corpo. Talvez você caia, sofra, se machuque e, como antes, tudo volte a escurecer, se tornar confuso, difícil, praticamente impossível. Mas talvez você seja mais forte. E ser forte não está no gene e não é sorte, é escolha. Você escolhe se vai ser forte ou não, não se é ou não. Você escolhe se vai colocar em prática toda sua sagacidade, suas lições e esquemas de defesa, ou se vai ser vítima, vai se jogar, derrotada, nos braços de alguém ou no chão desse alguém, que pode, muito bem, sair andando e te deixar lá, sem ajuda, sem preocupações, sem culpa. Afinal, não teria porquê o sentimento da culpa, não é mesmo? Foi você quem se jogou no chão, ninguém te empurrou, não importa o quão te influenciou, tendenciou. A escolha é, e somente é, sua.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

A Bela e a Pêra.

Bela era bela, possuía belos cabelos castanhos tímidos, belos olhos marceneiros de um olhar longe, bela pele suave, belos lábios rosados. Andava sem preocupações mas com pensamentos e esperas. Chegou em uma rua e só chegou à metade do caminho, seu celular tocou e então foi conhecido seu belo sorriso. Encantador. Sincero e singelo, doce e refletia o leve sol de fim de tarde. Não era preciso ser um admirador de sorrisos para admirar o tal. No celular, ninguém ouviu, não havia ninguém por perto, nem sua poodle se importou, mas certamente era aquela pessoa especial. Sabe-se lá se ela é heterossexual para denominar no masculino, mas certamente não era um amigo chegando de viagem, um parente com saudade, uma amiga com quem tinha se desentendido e se entendido novamente. Com certeza era uma pessoa especialmente em especial. Podemos chamar de pêra. Independe o nome, era especial. Um especial distinto, que te extrai algo sem te tocar um dedo. O especial, neste caso a pêra, que muda o contexto inteiro, o cenário, o clima, o humor. A pêra é capaz até de mudar o cheiro que o vento carrega, o julgamento com a primeira pessoa que passa na rua, os planos para o fim do dia e, principalmente, o destino. Por que nossa bela chegou só até metade de uma qualquer rua? Porque desviou seu andar no momento em que seu sorriso bateu de forte junto com a parte de falar do celular. Uns passos, uma virada e de volta de onde veio. Perdi a bela com os minutos, portanto não tenho como informar o destino, o princípio de volta, o carma, seja lá o que for. Mas sei dizer que me fez voltar a acreditar e querer eu ligar para a minha pêra. Me fez não sentir inveja, raiva ou ciúme por alguém ser feliz, mas sim admirar a felicidade da bela e querer ser feliz também. Me fez lembrar que eu também sou. Por um instante, me veio na cabeça uma imagem de eu mesma recebendo uma mensagem da minha pêra e sorrindo. Eu nunca me vi sorrindo, ao receber a mensagem da pêra, mas algo me diz que é igual. O mesmo sorriso leve e radiante, a mesma energia... E me fez pensar em como uma pêra pode ser capaz de mudar tanto uma pessoa, na verdade, como a relação das pêras é. Não basta só a pêra, tive pêras já sem eu ser uma maçã, por exemplo. O que realmente é preciso é da fruteira, onde a maçã e a pêra ficam juntas. Ai, ai, Bela... você me fez escrever metáforas com frutas! Ou será que foi culpa da minha pêra? Se eu não a tivesse, sacaria tudo isso, interpretaria tudo isso, do mesmo jeito, ou você seria só mais um ser humano passando pela calçada direita? Espero que seja a primeira opção, não me basta ter reflexões e filosofias às sete de um horário de verão, só por causa de uma pêra que ainda nem está na fruteira.

Trapaças.

Eu não queria te abandonar, não queria, no fundo, deixar a inteligência racional vencer, sabe, eu gostava de ser boba e ingênua, gostava das trapaças dos ses olhares e das tentações de todo o seu rosto, gostava de tudo que você me oferecia sem saber, talvez nem oferecia e era eu que alimentava uma sede de desejo sem limites que de certa forma se fundamentava em pequenos detalhes por vezes até despercebidos da sua parte. Mas mesmo assim eu gostava, no fundo eu gostava, bem lá no fundinho, como se fosse algo real, mas sabia, sim, sabia que não era real, bom, acho que não sabia, mas sim, sabia, no fundo eu sabia que era tudo besteira minha, enganação; aprendi a trapacear com o seu olhar. Mas eu ainda queria estar presente como se fosse meu destino estar ali, e olha que eu não acredito em destino, e sei que você também não, mas entenda, é modo de falar, talvez uma das formas mais claras de explicar porque eu abusava da insistência, porque eu permanecia ao seu lado, indo ao seu encontro, buscando mais detalhes e tentando ganhar das trapaças dos seus olhares. Era algo mais forte, que eu não queria deixar de lado; imagina só se existisse mesmo um bendito destino e eu desistisse? Bom, mas se existisse, algo seria maior que nós, e algo daria certo, pelo menos algo. Mas não, nada deu certo, exceto eu conseguir ganhar dos seus olhares, sou uma ótima trapaceira, agora; cada manha, cada singela trapaça, aprendi com você, obrigada. Mas não é sobre isso que quero focalizar, na verdade eu acho que perdi o rumo e todo o sentido... ah, voltando à metáfora do destino, sim, sim, nós dois não acreditamos nisso, mas dá para entender que de uma certa forma eu me sentia puxada para tudo que te pertencia, te cercava? É, pode suar estranho e eu sei que soa, mas acho que você nunca conseguirá ingerir de uma forma consciente e total a exata intensidade que eu carreguei comigo por todo esse tempo, por mais que tente, e claro, você não irá tentar. Afinal, por que tentaria? O que ganharia com isso? Mas e se você for o único que sairá prejudicado com tudo isso? E eu acho que é... porque eu sei e você sabe e já basta só nós dois sabermos, que ninguém jamais sentiu toda essa fixação por você, sim, fixação, eu me sentia fixa sem conseguir imaginar-me deixando-te. Como se, mesmo te superando, mesmo te esquecendo, mesmo deixando-te, mesmo não importando-me mais com o que dizia respeito à você, não podia deixar tudo. Acho que porque acreditava que cheguei longe demais, estava perto demais para decidir recuar. Mas depois descobri que não, nunca estive perto, quem diria demais! Você mesmo colocava uma barreira para manter uma certa distância, eu sentia que era por medo, que era por fraqueza, mas independentemente dos seus motivos, a plaquinha de aviso ainda estava lá. E eu não soube respeitar o perigo, nem ler o proibido bem estampado, só soube ir, ir, ir, ir. Como se estivesse quase chegando lá, por isso não podia recuar agora, chegaria tarde demais em casa, e cansada. Então continuava na trilha. E cada vez com menos medo, e conseguindo me virar com os obstáculos graças às trapaças. E me atrapalhando com as suas novas táticas de trapaças, e cansando, cansando... mas ainda assim, não podia deixá-lo. Mas cansei. É, você que se fodesse, que partisse, que ficasse, que se isolasse, que lamentasse, não me importava mais nada; estava tão escuro e tão frio, não havia mais cor, não enxergava a variedade, os detalhes, talvez por culpa do cansaço, ou da escuridão, mas eu estava em um estado esgotável, então parti, e tudo que consegui ou apenas pensei que consegui, deixei. Vieram comigo, cada pedaço da história, nas lembranças, mas deixei, abandonadamente isolados, em um lugar que era para você saber, e ver e lembrar e saber interpretar, cada pedaço, sim, cada pedaço. Mas acho que você juntou todos, formou um inteiro mal acabado e por isso eu estou aqui às três da manhã te escrevendo algo que provavelmente te mostrarei só daqui um ano ou mais provavelmente ainda eu nem te mostre, e não com uma certeza de que valeu a pena todo esforço, dedicação e passo a passo. Não desisti, tomei uma decisão. Mas às vezes bate essa sensação de que abandonei algo, e é tão difícil eu absorver a ideia de que não havia algo, não havia nada para eu uma vez ter abandonado... mas às vezes vem essa sensação, de que eu podia ter ido mais longe, mesmo sabendo que não estive nem um pouco distante, de que tudo que eu fiz teve algum efeito, por mais pequeno que seja. Mas pensando nisso fica tudo tão confuso de novo e me dá todo aquele cansaço de novo e eu fico até com sono, sem vontade de escrever mais, porque o texto fica mais sem nexo ainda e eu me confundo entre palavras e sentimentos e certezas e ilusões, então decido parar. Parar de escrever sobre o que acho ou deixo de achar, pois não faz muita diferença no final, mesmo.

(Ano de 2010)

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Conto [7]

Quezia entrara pela porta principal, enquanto ainda arrumava o vestido. Totalmente tímida, inexperiente e iluminosamente deslumbrante. O primeiro a cumprimentá-la, beijou-lhe as mãos erguendo-as na altura dos peitos. O segundo, quarto e restantes, apenas olharam, cada um com uma inclinação diferente. O terceiro era o posseiro. Abraçou seus braços femininamente frágeis e a acompanhou nas escadas até à plateia familiar. As champanhes, jóias e ternos escancaradamente sublinares, a sede de status presente em cada conversa superficialmente industrializada e bancária, passavam batidas por Quézia. Não sorria quando ouvia preconceitos como a roda de grandes nomes fazia, nem heterogenizava a sala com um olhar ignorante e capitalizado. O jardim, visto à alguns metros, quase que disfarçado pelos conjuntos de lustres, a despertou vontade e ainda mais uma sensação de oportunidade de fuga, de se libertar de tantas grotescas conversas e atitudes nobrementes falsas e sarcasticamente modernas. Foi, então, disfarçadamente, ao caminho mais discreto que a levava ao jardim. Porém, esse caminho era constituído por quadros, relíquias e portas. Dessas portas, uma conhecia, era a porta do mundo do seu namorado oficial há duas semanas mas amigo confidencial há anos, e seu próprio mundo também, consequentemente. Aquela porta a chamou atenção puxando-a por energia, e ao tocar na maçaneta já sabia que era fato. Fato o que queria. Que queria conversar sobre sua família, mas não apoiar suas revoltas com seus pais extremos e adestrados. Entendia a indignação, a inaceitação, a diferença. Também era diferente. Mas entendia mais que isso. O cheiro do lençol, os dicos, as roupas e os objetivos que discreviam pouco a pouco partes de sua personalidade impetuosa, os documentos e as fotos que registravam ideologias e batalhas; ela entendia tudo, e era tudo que a mais conquistava, além de seu olhar firme e quente, seus braços fortes e acolhedores. Saiu do quarto de volta à sala, sem direito a jardim, em busca do colecionador de jornais antigos. O achou e o destino foi o jardim, sem se importarem com a classe alta criticar o gesto mal educado e inadmissível dos jovens, que não sabem o que fazem. Jovens negligentes, que se não precisam de sonhos, basta seus fardos hereditários.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Acreditar.

Coisas banais estilo conto de fada me fazem desejar de uma forma fiel, que você esteja, realmente, pensando em mim agora. Apago a mensagem de texto, desisto, pela 5ª vez, da ideia de te enviar algo, aperto forte o celular, respiro, aproximo-o do meu peito querendo acreditar em tudo de novo... fadas, conspiração, atração de pensamentos. Acreditar que alguém possa pensar em mim, voltar a acreditar no que rotulam como machismo meu, regresso, mas para mim ainda faz algum sentido. Em toda aquela história de relacionamento, em algo sólido, algo raro, algo celestial. Acreditar em algo. Nos almoços de família e nos elogios dos seus pais,na sobremesa e na amizade com o seu avô. Acreditar em nós, em um final de semana, em "se voltar é seu". Acreditar, sem precisar forçar, que você se importa, que você vai ligar, que vai mandar uma mensagem inesperada de madrugada como daquela outra vez.

Interpretações.

Ela gostava de partes. Pequenos fragmentos luminosos que a chamavam atenção eram adotados quase que como uma filosofia de vida. Acreditava ser uma uma qualidade, mas com o passar do tempo e seu amadurecimento, percebeu que podia ser um grande defeito. Ou pura inocente imaturidade, que leva à pequenos prazeres. De qualquer jeito, era insuficiente, ralamente vazio. Não bastava tão pouco, não queria se limitar em detalhes que ela própria aumentava a intensidade e o significado, quando, na verdade, muitas vezes não passavam de pequenas observações. Ela então mudou, agora quer escrever escrever sobre histórias e confissões, não descobertas e atenção. Quer alguém que a inspire e permita, a incentive e a confesse tudo, qualquer, muito; não quem se paralisa enquanto ela estuda pequenos momentos involuntários e interpreta da forma mais bonita.