quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Fuga

Eu percebi que estava usando essa paixão como desculpa para não sofrer por coisas mais sérias, que despertassem crises existenciais e loucuras. Vendei meus olhos: filmes de lembranças e saudades. Preferi sofrer por amor, pois, perdendo meu tempo pensando em bigode e oral e voz e matanza e gong e corpo, não pensava em cidades, movimentos, ideologias, atitudes, escolhas, papelada. Preocupava-me mais com suas matérias reprovadas,para não chorar pelas minhas. Continha minha atenção na preocupação de suas dores, para não perceber as minhas, que gritavam, mas gritaram tanto, que se esconderam, por não receberem atenção suficiente. Percebi que se esconderam e usei isso ao meu favor, fazendo sempre a mesma coisa e voltando a desejar você e focar toda a minha atenção em você. Era mais importante te dar mais um beijo e levar para atrás da área na qual estava acontecendo o festival de música do que estudar meristemas primários e secundários. Não queria parar para pensar nas minhas escolhas, não queria perceber que sentia falta de criança e me emocionava com Paulo Freire, troquei literatura de educação ambiental ou até mesmo livros massantes obrigatórios para Bukowski. Queria ser a mudança do seu mundo, por medo de enfrentar o meu. Queria ser um marco que lhe provocasse ardência por uma nova vida. Sofria, sim, cada vez que sonhava que cozinhava com sua mãe e que você dormia, no final da noite, do meu lado. Sofria, quando acordava e via que a minha cama não estava sendo compartilhada. Mas, francamente, era mais fácil sofrer por isso do que pela realidade das minhas escolhas, pelas consequências que enfrento e pelas futuras mudanças que só estão aguardando minha coragem. Ainda absorvia Hang On To a Dream com incensos. Absorvia cigarros, Casa das Máquinas, álcool: era uma forma de te manter por perto, sentir sua presença, mesmo no vacuo. Lia seu autor preferido, tentava acreditar que você pensasse como ele, admirava Lygia, voltava a fumar, fumava atrás da área, chorava, queria, no fundo, que você fosse como Chinaski. Bêbado safado mas que sabia enxergar as qualiaddes em suas mulheres. Algumas o tocavam - profundamente. Significavam algo. Troço para ser uma dessas, em sua vida. É, você foi uma fuga. Uma delícia, da espécie amarga-quero-mais. O bom, do momento, é ter percebido isso. Continuo achando que foi lindo o pouco que vivemos, pelo menos o que eu vivi e senti. E esperando que eu não tenha sido apenas mais uma que passou com a manante. . http://www.youtube.com/watch?v=eJMH-NfHykw "I would run away with you..."