segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Conto [6]

Então recebeu uma notícia: a mais surpreendente e chocante e arrasadora até o momento. Já sofrera antes, sim. Já conhecia a amargura de muitos sentimentos infelizes, mas nunca foi tão desconhecido. A partir do momento em que atendeu ao telefone até o final dessa tortura, foi uma tortura. A cada passo que dava, tortura. Pessoa que via, tortura. Tudo tortura. Foi um choque e o tempo acostumou os outros com a ideia, mas à ela só restava tortura. Ele ficou internado. Sua família não podia ficar muito para fora da cidade, então apenas esperavam as notícias. Amigos, conhecidos, levavam suas vidas também na espera. Mas ela, a pessoa mais improvável no contexto, foi a que mais se aproximou. Não posso deixá-lo sozinho, pensava ela, tantas vezes em tantos dias. "Mesmo sem você ter consciência disso, não consigo." E conversava com ele todos os dias, com uma esperança de que ele pudesse ouvir, ou sentir, por mais cético que fosse. "Não posso dormir sabendo que você pode não acordar. Não posso virar as costas e não saber se você já acordou. Só quero saber que você está bem. Não consigo parar de te olhar e te querer acordado, frio ou quente, simpático ou indiferente, mas passando ao meu lado deixando rastros do que me tira, sem você nem perceber, devido a minha capacidade de amá-lo cada dia mais, por mais que você não acredite que seja possível." Ela dizia com olhar de quem ama, voz de quem se preocupa e dedicação de quem se importa. Todos os dias, sem exceção, estava ao lado esquerdo dele. Com as mãos em suas mãos, ou nos cabelos. Às vezes lia histórias, contos por ela mesma escritos, outrora artigos de revistas científicas. Uma hora levou o violão do seu amigo e tocou várias e várias vezes o único trecho da única música que sabia tocar. Até improvisava e tocava daquele jeito todo errado, mas de acordo com a melodia, e cantava algumas músicas. A vez que mais chorou foi quando cantou Let It Be. Mas logo voltou às histórias. Umas inventadas, outras improvisadas... Quando o sono batia, ali mesmo dormia. Deitava ao lado dele, abraçando-o com intensidade. Deixava algumas lágrimas cair vez ou outra, enxugava com o lençol da cama ou simplesmente deixava-as secar. Não cansava de acariciar suas mãos. E de pensar o quão injusto seria perdê-lo. O quanto o mundo perderia, o quanto de riso seria apagado. Entregou-lhe beijos e recitava textos. Um dia, enquanto o observava e contava de um de seus textos inspirados em uma de suas conversas, ela teve a melhor visão que já teve em toda sua vida. Ela jura que foi mais lindo do que quando ele sorriu daquela especial vez, do que quando ele pegou sua mão daquela outra, de suas viagens preferidas, daqueles céus coloridos que ela admirava com doçura, daquele dia no teatro e tantos outros momentos que com uma imagem a fez demasiadamente feliz. O dedo dele mexeu. Da mão esquerda, para cima e para baixo, daquela vez mais rapidamente. Foi o fim da tortura. Ela sentia de novo o chão, o ar condicionado do quarto, seus cabelos sob os ombros, o peso de suas roupas. Foi chamar ajuda depois de beijar aquela mão com um sorriso do tamanho da felicidade, com a intensidade da alegria e da leveza da preocupação e da tristeza indo embora. Foi ficando tudo cada vez melhor. E ela continuou acompanhando. Os olhos dele se abriram e a viram; e a tortura passou. Ele sorriu, soltou a voz, a tortura passou. Esse foi o momento. Agora ele podia fazer qualquer coisa, até machucá-la como de costume, ela permitia, mas ele voltou.

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